terça-feira, 11 de outubro de 2011

Infância e Marco

Logo que me conscientizei sobre a necessidade de um blog para que houvesse uma aproximação calorosa entre eu e o leitor, confesso que me preocupei. Afinal, tudo que é novo é estranho, e tudo que é estranho tende a “roubar” nossa atenção de modo especial. Foi aí que cheguei à conclusão de que, quando nos propomos sermos eloquentemente verdadeiros, as idéias fluem naturalmente como a formação do próprio vento no oceano, predestinado a morrer em qualquer ponto cardeal. Mim senti até aliviado depois de tal convicção; agora, creio ainda mais que a melhor ponte para unir “universos” distantes é o próprio coração.

Não quero está aqui apenas para abordar temas ligados a literatura; mas, como também falar da vida, de mim, de amigos, de pessoas e de família. Quero que o meu coração supervisione minha mente e mãos ao me expressar através de escritos sobre minhas necessidades comunicativas. Não tenho a pretensão de ser o melhor, ou mais um; porém, dar de mim do modo mais sincero e afetuoso possível, informações sobre qualquer que seja a crítica e ponto de vista defendido por mim. É uma honra para eu interagir com você leitor, por meio de simples abordagens sobre esses maravilhosos temas citados acima; especialmente literatura e família. Como enfatizou a atriz Cássia Kiss Magro no quadro ARQUIVO CONFIDENCIAL do programa DOMINGÃO DO FAUSTÃO do dia 24/07 em uma conversa com a platéia e o telespectador sobre família e educação de filhos: “Família ainda é o tema que mais toca a humanidade”. Concordo plenamente com a opinião madura e sensata dessa atriz extraordinária, mãe de família exemplar e grande mulher. Por isso, eu como escritor de primeira viagem me preocupei muito com a composição do meu livro “Dois Pais Brasileiros”, que retrata principalmente a deficiência da personalidade de alguns indivíduos que crescem em lares carentes de estrutura familiar.

Em virtude dessa preocupação, precisei de quase quatro anos para deixar a obra completamente pronta. Acho fundamental ser criterioso na elaboração de um trabalho, principalmente, quando este trabalho trata-se de uma arte ou está ligeiramente ligado a ela. Bem; voltando a falar do blog, nessa primeira semana de sua existência vamos dar destaque a Infância e o que dela fica marcado por toda nossa vida; através de dois diferentes poemas escritos por dois saudosos autores maravilhosos, que é o Cassimiro de Abreu e a Ruth Rocha. Afinal, tudo é determinante na infância.

(Cassimiro de Abreu)

Oh! que saudades que tenho

Da aura da minha vida,

Da minha infância querida

Que os anos não trazem mais!

Como são belos os dias
Do despontar da existência!

- Respira a alma inocência

Como perfumes a flor;

O mar - é lago sereno,

O céu - um manto azulado,

O mundo - um sonho dourado,

A vida - um hino d'amor!

Que aurora, que sol, que vida,
Que noites de melodia

Naquela doce alegria,

Naquele ingênuo folgar!

O céu bordado d'estrelas,

A terra de aromas cheia

As ondas beijando a areia

E a lua beijando o mar!

Oh! dias da minha infância!
Oh! meu céu de primavera!

Que doce a vida não era

Nessa risonha manhã!

Em vez das mágoas de agora,

Eu tinha nessas delícias

De minha mãe as carícias

E beijos de minha irmã!

Livre filho das montanhas,
Eu ia bem satisfeito,

Da camisa aberta o peito,

- Pés descalços, braços nus -

Correndo pelas campinas

A roda das cachoeiras,

Atrás das asas ligeiras

Das borboletas azuis!

Naqueles tempos ditosos
Ia colher as pitangas,

Trepava a tirar as mangas,

Brincava à beira do mar;

Rezava às Ave-Marias,

Achava o céu sempre lindo.

Adormecia sorrindo

E despertava a cantar!

Oh! que saudades que tenho
Da aurora da minha vida,

Da minha infância querida

Que os anos não trazem mais!

- Que amor, que sonhos, que flores,

Naquelas tardes fagueiras

A sombra das bananeiras

Debaixo dos laranjais!

Quem dera se todas as crianças dos lares em geral tivessem o privilégio que o poeta Cassimiro de Abreu, ou o personagem central do poema “Meus Oito Anos” teve! É uma infância merecida a qualquer criança; independente de classe social, raça ou credo. Pois a esses pequenos indivíduos não foi possível conceder-lhes por ninguém o direito de planejar os mágicos momentos da infância...

AI QUE SAUDADES!

Ruth Rocha

Ai que saudades que tenho
Da aurora da minha vida
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais...
Me sentia rejeitada,
Tão feia, desajeitada,
Tão frágil, tola, impotente,
Apesar dos laranjais.

Ai que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Não gostava da comida
Mas tinha que comer mais...
Espinafre, beterraba,
E era fígado e era fava,
E tudo que eu não gostava
Em porções industriais.

Como são tristes os dias
Da criança escravizada,
Todos mandam na coitada,
Ela não manda em ninguém...
O pai manda, a mãe desmanda,
O irmão mais velho comanda,
Todos entram na ciranda,
E ela sempre diz amém...

Naqueles tempos ditosos
Não podia abrir a boca,
E a professora era louca,
Só queria era gritar.
Senta direito, menina!
Ou se não, tem sabatina!
Que letra mais horrorosa!
E pare de conversar!

Oh dias da minha infância,
Quando eu ficava doente,
Ou sentia dor de dente,
E lá vinha tratamento!
Era um tal de vitamina...
Mingau, remédio, vacina,
Inalação e aspirina,
Injeção e linimento!

E sem falar na tortura:
Blusa de gola engomada,
Roupa de cava apertada,
Sapatinho de verniz...
E as ordens? Anda direito!
Diz bom dia pras visitas!
Que menina mais sem jeito!
Tira o dedo do nariz!

Que aurora! Que sol! Que nada!
Vai já guardar os brinquedos!
Menina, não chupe os dedos!
Não pode brincar na lama!
Vai já botar o agasalho!
Vai já fazer a lição!
Criança não tem razão!
É tarde, vai já pra cama!

Vê se penteia o cabelo!
Menina se mostradeira!
Menina novidadeira!
Está se rindo demais!
— Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras,
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais.

... Já aquí, vimos uma irônica queixa da autora Ruth Rocha ou da personagem que de imediato só diz tratar-se de uma sátira ao poema “Meus Oito Anos”, mas que, em momento algum afirma ter tido uma infância triste. Há pais que até os dias atuais impõem essa conduta autoritária sobre os filhos; entretanto, não negligenciam os afetos de que os filhos precisam para sentirem amados, através de um cafuné, de uma brincadeira saudável. Enfim, o que não está evidente é o possível medo que esses pais involuntariamente cultivam; de serem dominados pelos filhos. Sendo assim, tal tratamento não deixa de ser também um mecanismo de proteção às proles. Existem filhos que crescem revoltados, interpretando esse autoritarismo como a margem da desarmonia; no entanto, existem “grandes” homens e mulheres que são gratos aos pais pelo pulso firme com o qual eles dispuseram para conduzi-los em um caminho de retidão. Que não tomamos partido... Mas que, sejamos solícitos a nos posicionar apenas contra toda e qualquer tipo de violência. Agora, cá para nós: Quem não gostaria de recordar as delícias da infância com suspiro poético, como Cassimiro de Abreu?